Dardos unem diversão, matemática e sonho de disputar Olimpíadas
Tatuí, no interior de São Paulo, recebe competição que inclui gente que pratica esporte como hobby e até candidatos a profissionais
Diogo Portela sonha em transformar o hobby em
profissão (Foto: Deise Voigt/Globoesporte.com)
O que separa essa estrela ascendente dos Jogos Olímpicos não é necessariamente a falta de verba e de apoio, problema enfrentado por milhares de atletas em todos o Brasil. O “problema” de Diogo é seu esporte - que muitos, aliás, nem sequer consideram um esporte, mas um passatempo. Diogo é jogador de dardos.
Sim, dardos, aquela brincadeira que adultos costumam fazer no bar, entre uma golada e outra num copo de cerveja. Para muita gente, não tem nada de brincadeira: é coisa séria, ainda que possa render momentos de diversão e bons amigos. Foi nesse clima que Portela disputou - e venceu, para não perder o costume - o Torneio Open de Tatuí, disputado no último fim de semana, em Tatuí, no interior de São Paulo.
A cidade, conhecida por seu conservatório, virou, nos últimos anos, uma espécie de Meca para quem leva o jogo de dardos a sério. Tudo por causa do neozelandês Nathan Perks, que se mudou para a cidade há quase uma década, depois de uma passagem pela Inglaterra, e, para matar as saudades, resolveu ensinar aos amigos o esporte que, na terra da Rainha Elizabeth, é quase tão popular quanto o futebol.
- Eu adoro todo tipo de esporte, sou muito competitivo. Na Inglaterra, os jogos são realizados em bares e são tão populares que chegam a ser transmitidos ao vivo pela TV. Cada bar tem seu grupo. Aqui, fizemos algumas adequações. Jogamos de forma individual e, claro, a cerveja esquenta muito mais rápido - brnca Perks.
Nathan Perks perdeu o posto de campeão, mas ainda se diverte (Foto: Deise Voigt/Globoesporte.com)
Ação entre amigosO “gringo” admite que seus amigos brasileiros foram atraídos pelo alto grau de sociabilização do esporte, tanto que, nos dois primeiros anos, suas competições eram apenas entre o grupo original. Mas as notícias no meio correram e, aos poucos, os campeonatos em Tatuí começaram a atrair outros interessados.
O Open, que reuniu 16 participantes, foi apenas um ensaio para o 7º Campeonato de Dados da cidade, que será disputado em 10 de novembro e deve receber 30 jogadores. Perks, de grande astro, hoje virou apenas um organizador, e admite que é movido pela diversão.
- A qualidade dos atletas têm melhorado e o esporte está crescendo. Fui vice no campeonato passado e, neste aqui, fiquei em quarto... Claro que eu gosto de ganhar, mas, quando perco, pelo menos me diverti.
Robert Shoe se diverte e faz contatos profissionais
(Foto: Deise Voigt/Globoesporte.com)
- Eu encaro como algo sério, mas não posso negar que o jogo de dardos já me trouxe contatos profissionais.
Sonho olímpico
Voltemos a Diogo Portela, aquele que sonha com as Olimpíadas. O “dardista” carioca cresceu vendo o pai e o avô portugueses jogarem dardos nos fins de semana, soma conquistas e sonha em se profissionalizar. Mas, enquanto isso não acontece, usa os conhecimentos adquiridos como economista para se dar bem nas provas de pontaria.
- Os dardos exigem muito raciocínio lógico, muita matemática, muita estratégia. Minha profissão ajuda, não posso negar. Mas eu também treino, vejo muitos jogos e leio muito. A Federação Mundial de Dardos quer transformar a prática em esporte olímpico. Isso quase aconteceu em Londres e há possibilidades de que aconteça em 2020. Se acontecer, me vejo com condições de, quem sabe, representar o Brasil nas Olimpíadas.
A WDF, sigla em inglês para a “Fifa dos dardos”, tem 68 países associados, uma estimativa de 250 mil jogadores cadastrados em todo o mundo e até seu próprio “Grand Slam”, com competições na Inglaterra, na Alemanha e na Holanda. A premiação aos vencedores desses torneios pode chegar a R$ 200 mil.
Mas, para se filiar ao Comitê Olímpico Internacional (COI), e poder sonhar com a presença nos Jogos, a WDF precisa estar organizada em 74 países. O Brasil ainda não entrou nessa conta - os cerca de 5 mil praticantes do país estão filiados a federações estaduais e à Federação Brasileira de Dardo (FBD).
Campeã da Copa Caribe, Monica também quer ser
profissional (Foto: Deise Voigt/Globoesporte.com)
Se o dardo virar esporte olímpico, ele já tem até uma candidata a musa:
Monica Ribeiro, 36, campeã da última Copa do Caribe, primeira
brasileira a conquistar esse feito, que permanece inédito entre os
homens. A consultora de moda conheceu os dardos por acaso num bar do Rio
de Janeiro. Depois, começou a namorar um jogador. O namoro acabou, mas a
paixão pelos dardos permaneceu.profissional (Foto: Deise Voigt/Globoesporte.com)
- Me dedico há nove anos, com alguns intervalos... Mas, a partir dessa competição internacional, a disputa virou coisa séria para mim. Foi muito bacana representar o meu país e chegar aonde nenhum outro brasileiro chegou antes. Treino duas horas por dia, três vezes por semana. Temos, também, os encontros semanais no mesmo bar onde conheci o esporte. Sei que não é o ideal, pois profissionais treinam cinco horas diárias. Dardos só trazem vantagens. Estimulam o raciocínio e têm alto grau de sociabilização – faz propaganda.
Terapia
Diferentemente de Portela e Ribeiro, Maritzia Monteiro e Marcos Bueno encaram os dardos como diversão, uma forma de esvaziar a cabeça dos problemas do dia a dia. Funcionária pública no Rio, Maritzia esteve na Copa do Caribe, mas vê os dardos como a oportunidade de “limpar a mente”.
- Todo dia eu jogo pelo menos meia hora. Às vezes, faço um treinamento. Mas na maioria dos dias, é uma terapia. Como o jogo exige muita concentração, é o momento em que eu me livro dos problemas. Eu recomendo, porque funciona.
O publicitário Bueno, que se inscreve em todos os campeonatos em Tatuí desde a primeira edição, é apaixonado pelo esporte como forma de aumentar a criatividade.
- Eu jogava dardos desde 2004 com um amigo. Cheguei a construir meu próprio alvo com corda de sisal, a partir de medidas oficiais que imprimi na internet. Quando soube do campeonato em Tatuí, me juntei ao grupo. Cheguei a ser vice-campeão e a disputar o Campeonato Paulista de Dardos por Tatuí. Mas, no fundo, é outra história. Às vezes estou estressado no meu escritório e paro por alguns minutos para relaxar. Dardo alivia a pressão, é um jogo estratégico e que depende só de você, diferente dos esportes de equipe.
Em Tatuí, a disputa foi unificada, sem separação por sexo. Diogo Portela levou o título e a “bolada” de R$ 150, depois de vencer Robert Shoe na decisão – o americano embolsou R$ 80. Monica Ribeiro terminou na terceira colocação e faturou R$ 100, metade pela posição e metade como prêmio extra por ser a mulher melhor colocada.
Para quem quiser se juntar a eles, não é difícil de começar. Para treinar, é preciso adquirir um alvo e um jogo de dardos, que estão disponíveis nas boas lojas de materiais esportivos. O custo, de acordo com os participantes, gira em torno de R$ 400.
- É o mesmo que custaria um bom par de chuteiras para jogar futebol - avisa Diogo Portela. Quem quer arriscar?
Maritzia Monteiro usa os dardos para "limpar a mente" (Foto: Deise Voigt/Globoesporte.com)